Sandro Miguel mistura Chacarera, Milonga e Rap com Alma Gaúcha
- Jorge Murilo

- 6 de out.
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Por Jorge Murilo, 06/10/2025 às 09:00

No coração do Rio Grande do Sul, onde o pampa encontra o asfalto, O Sandro Miguel emerge como uma força inovadora no rap brasileiro. Aos 31 anos, o artista de Porto Alegre, radicado em São Sebastião do Caí, celebra em 2025 uma década de carreira com lançamentos que desafiam fronteiras rítmicas.

Seu single mais recente, "Te Quiero", lançado em agosto de 2025, funde milonga – o ritmo pampeano de raízes uruguaias e argentinas – com boom bap, o batidão clássico do hip-hop old school, criando um hino romântico que evoca amores efêmeros sob o céu gaúcho.

Mas é "Baita", seu maior sucesso até o momento, que rouba a cena este mês: a faixa, com mais de 4 mil streams no Spotify, ganhou vida nova em uma apresentação à capela na festa de comemoração do Dia do Gaúcho, em 20 de setembro, transmitida ao vivo pela RBS TV.

Em um momento de puro orgulho regional, Sandro entoou os versos à capela, conectando gerações em um espetáculo que viralizou nas redes. Esse momento destacou a força simbólica de Baita, que se apoia em expressões locais para falar de identidade e alegria. Em entrevista exclusiva à Revista Dissonância, O Sandro Miguel contou como nasceu a ideia da música:
“Eu comecei a produzir essa música por conta de outra, ‘Buenas’. [...] O DJ Cabral me disse que eu precisava fazer algo mais curto, mais comercial. Um amigo sugeriu: ‘usa um termo gaúcho, baita!’. A partir daí comecei a buscar referências, escutando chacareira argentina e trazendo elementos da tradição. Eu tento usar o máximo de coisas boas da cultura gaúcha, colocando no rap, pra que a nova geração entenda nossa tradição”
Nascido em 1994 em uma família humilde de Porto Alegre, Sandro Miguel Gonçalves da Silva descobriu o rap em 2014, durante um show que ele atribui a uma "intercessão" espiritual de São Pio de Pietrelcina.

Influenciado por samba, pagode, rock e as rádios Atlântida, MTV e Mix TV, ele aprendeu violão no grupo de jovens da Igreja Católica (CLJ), formando bandas paroquiais com covers de sucessos da época. Sua estreia veio em 2015 com a mixtape O Desacreditado que Acreditou, financiada com a venda de brigadeiros em pontos de ônibus e na Trensurb – duas faixas tocaram na Rádio Atlântida RS, abrindo portas para entrevistas locais.

Em 2018, lançou o EP Intercedo ou Perco Tempo?, com o single "Hey, Bela", cujo clipe foi gravado no Barco Noiva do Caí e ganhou uma versão acústica no Festival Old Fort Fest, em Minas Gerais, inspirando o documentário Ultramontanos sobre artistas independentes.
Poeta nato, Sandro publicou livros digitais como Madura, inspirado na bergamota e na vida no Vale do Caí, para onde se mudou há cerca de quatro anos em busca de raízes. O que define Sandro, porém, é sua alquimia sonora: um rap que ele chama de "direita emergente", criticando o que vê como excessos do gênero mainstream – objetificação de mulheres, drogas e crime –, enquanto injeta valores conservadores enraizados na fé católica e na tradição gaúcha. Em uma reportagem do O Globo de 2019, ele explica: "Muitos artistas objetificam as mulheres nas letras, falam de drogas, de crime – não estou falando de metáfora –, e sou contra tudo isso."
Essa essência brilha em "Baita", lançada em 2023 como parte do EP Buenas!!!, produzido em parceria com Lele Griebler e apoiado por marcas locais. A música mistura rap com chacarera argentina – um ritmo folclórico do noroeste argentino, marcado por violões e percussão animada, evocando festas rurais. Em entrevista exclusiva à Revista Dissonância, Sandro revela que, além dos elementos regionais, incorporou também momentos pessoais:
"Tem uma frase que eu falo 'mi rosa colombiana, nuestra fiesta em la cama' é por conta de um relacionamento que eu tive e a guria gostava da Rosa Colombiana, então coloquei esse elemento, achei bacana de acrescentar. E 'baita' é uma coisa boa, eu geralmente coloco coisas boas. Eu tenho essa missão de, ao invés de ficar colocando coisas que vão dispersar muito as pessoas, [...] eu tento utilizar o máximo de coisas boas da cultura gaúcha, colocando no rap, pra que a nova geração entenda um pouco da nossa tradição."
O lançamento mais recente, Te Quiero (2025), reforça essa proposta de fusão rítmica. A faixa combina milonga e boom bap, revelando a versatilidade do rapper e sua vontade de expandir as fronteiras sonoras.
“Depende muito do que eu estiver escutando. Se alguma coisa me chamar atenção, vou querer fazer a mistura e o céu é o limite”, destacou o artista, que já se arriscou até em parcerias com o folk, ao lado de Lucas Rinor.
Disponível no Spotify e YouTube (@OSandroMiguel), o single já anima playlists regionais, acumulando visualizações modestas, mas crescentes. Sandro, que se autoproduz desde 2019, vendendo até marca-páginas com letras para financiar projetos, reflete sobre desafios na Dissonância:
"No início eu vendia doces para produzir as músicas, pra pagar tanto o produtor musical [...]. Hoje minha maior superação é mais nesse sentido [de produção]. 'Baita' e 'Te Quiero' são músicas que eu produzi, que eu fiz, que eu me gravei, mixei, escrevi."
Sua espiritualidade, outrora explícita, agora permeia sutilmente as obras. "Eu continuo rezando [...]. Hoje em dia eu não coloco os elementos evidentemente nas músicas. Eu tento ser mais acolhedor. [...] Eu tô falando de Deus ao mesmo tempo. Eu tô falando de espiritualidade, eu tô falando de coisas saudáveis", confidencia ele.

Essa maturidade se reflete nas misturas: além de chacarera em "Baita" e milonga em "Te Quiero", Sandro já fundiu trap com vaneira e rap com folk pela batuta de Lucas Rinor, seu ex-professor e amigo. "Depende muito do que eu estiver escutando [...]. O céu é o limite. Tem muita coisa pra [...] ser muito saboreada", adianta na entrevista.

Em um setembro que se estendeu como o "mês do gaúcho", O Sandro Miguel não só celebra tradições, mas as reinventa. Com shows agendados no Vale do Caí e parcerias em vista, ele planeja um novo EP que aprofunde essas hibridizações:
"Pra que a nova geração tenha esse contato com a tradição com os elementos, com palavras que a gente já utiliza no dia a dia mesmo".
Para os fãs, "Baita" e "Te Quiero" são pontes entre o ontem do pampa e o amanhã do trap. Com autenticidade e perseverança, O Sandro Miguel segue reinventando o rap, unindo trap, vaneira, milonga, folk, boom bap e tradição gaúcha em um repertório que conecta gerações e cria novas possibilidades para a música brasileira.
Acompanhe Sandro Miguel no Instagram (@miguelgoncalves.oficial), Facebook (OSandroMiguelOficial), Spotify e YouTube. O reel da RBS TV está disponível em seu perfil para reviver o momento histórico do Dia do Gaúcho.
Veja a mistura de Trap e Vanerao no clipe de Buenas:

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