Sandro Miguel em Dissonância: entrevista exclusiva
- Jorge Murilo

- 6 de out.
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Por Jorge Murilo, 06/10/2025 às 09:00
O rapper e produtor O Sandro Miguel é uma das vozes mais autênticas da nova cena gaúcha, unindo o rap às sonoridades e expressões da cultura do Sul. Em sua caminhada independente, ele transforma vivências, fé e tradição em música, misturando boom bap, milonga, chacareira e trap com naturalidade e propósito. Nesta entrevista exclusiva à Revista Dissonância, o artista fala sobre o processo criativo por trás de sucessos como Baita e Te Quiero, reflete sobre espiritualidade, desafios da independência e o papel de sua arte na valorização da identidade gaúcha.
Dissonância: Como surgiu a ideia da música Baita e quais foram as inspirações por trás dela?

O Sandro Miguel: Cara, eu comecei a produzir essa música por conta de uma outra. Primeiro eu tinha feito “Buenas” em 2022 e daí tava divulgando e esse ano tocou na rádio da rede filiada da Globo que é a RBS TV, que tem uma filiada por rádio, que seria a 92FM. Mandei pro DJ de lá, e a música era um pouco mais extensa. Ele tocou a música nuns sábados e botou na programação. Quando a gente tava conversando novamente, ele falou: Cara, tu tens que fazer uma música mais curta, que pegue mais, que seja comercial. Eu tinha conversado com um amigo meu e ele falou: Cara, usa um termo gaúcho, “baita!”, quem sabe. O Mauricio Martins, ele é uma das pessoas que me apoia desde o início, eu comecei em 2015. Daí, surgiu o “Baita”, por conta do DJ Cabral da rádio 92Fm e esse meu amigo Maurício. Daí eu comecei a buscar referência do que eu podia fazer, comecei a escutar muita “chacareira argentina”. Treinando da academia, todo mundo bota geralmente rock, bota trap, bota rap, bota vários estilos mais eletrônica e eu tava escutando chacareira que não é uma música pra treinar, mas tava escutando pra me inspirar. Usei alguns elementos da tradição, de coisas que eu vivenciei, que eu vi, né? Por exemplo tem uma frase que eu falo “mi rosa colombiana, nuestra fiesta em la cama” é por conta de um relacionamento que eu tive e a guria gostava da Rosa Colombiana, então coloquei esse elemento, achei bacana de acrescentar. E “baita” é uma coisa boa, eu geralmente coloco coisas boas. Eu tenho essa missão de, ao invés de ficar colocando coisas que vão dispersar muito as pessoas, coisas que não vão levar elas pra um caminho virtuoso e mesmo sendo em festa tem com tu fazer uma música de festa sem ficar propagando várias coisas que são ‘comuns’, entre aspas, hoje em dia. Então eu uso esses termos, ‘baita’, ‘buenas’. Eu tento utilizar o máximo de coisas boas da cultura gaúcha, colocando no rap, pra que a nova geração entenda um pouco da nossa tradição. Até agora a gente tá no mês, a gente falava antes que era ‘dia farroupilha’, ‘dia do gaúcho’, depois virou uma semana, depois virou duas, agora a gente já tá no mês do gaúcho, pra nós aqui, a gente aproveita bastante. Então, pra que a nova geração tenha esse contato com a tradição com os elementos, com palavras que a gente já utiliza no dia a dia mesmo.
Dissonância: Como a sua fé e espiritualidade influenciam a sua música hoje em dia?

O Sandro Miguel: Olha, eu continuo rezando, faz tempo que eu não vou na missa, mas eu sei a importância de ir na missa, de me confessar, ir pelos preceitos daquilo que eu aprendi, daquilo que eu acredito. Hoje em dia eu não coloco os elementos evidentemente nas músicas. Eu tento se mais acolhedor. Antigamente, quando a gente se converte, isso eu creio que seja algo pra qualquer coisa que a gente vai fazer, seja pro empreendimento, seja pra religião, seja pra política, seja pro que for, nós começamos a defender aquilo, porque a gente começa a acreditar que aquilo trouxe uma emoção tão grande pra gente, que a gente começa a defender com unhas e dentes. Mas depois quando a gente vai amadurecendo e vai vivenciando as coisas, vai vendo que nem tudo é, como minha fala, ‘a ponto de faca’, da ponta da faca, a gente vai começando a escutar mais, vai sendo mais acolhedor, de fato, e eu tô mais nessa fase. Então, eu falo de Deus, sim, continuo colocando Deus sobre as questões básicas das músicas, sobre as coisas boas. Se Deus é bom, eu tenho que falar das coisas boas e tudo que ele fez tá dentro disso. Somo a criação dele, pra mim. Somos a criação e como somos a criação, eu tô falando de Deus ao mesmo tempo. Eu tô falando de espiritualidade, eu tô falando de coisas saudáveis, eu to falando de Deus também. Eu creio que, eu falar do cotidiano, já eu falar de Deus, sabe? Eu não consigo desassociar essas coisas. Eu creio que, por mais que eu esteja falando de música, a tradição, principalmente, Deus é uma tradição. Nem sei te dizer o tempo, não tem como mensurar o tempo de existência de Deus. Então, eu creio que eu esteja falando de Deus até conversando contigo agora, até na entrevista, a gente tá falando de Deus, porque é pra se conhecer. As pessoas que vão ler a reportagem, vão conhecer a mais de mim e eu tenho um pedaço de Deus na minha vida, na minha essência, ele me criou. Eu creio que eu esteja falando de Deus a todo momento, por mais que não seja puramente religioso, na essência da teologia, por exemplo, eu tô falando de Deus.
Dissonância: Como artista independente, qual o maior desafio que você já superou ou espera superar?

O Sandro Miguel: Olha, no início eu vendia doces para produzir as músicas, pra pagar tanto o produtor musical, o beat maker, quanto pra master, pra fazer clipe. Então eu vendia doces, depois vendi marca-páginas com as letras da música, criei isso. E, por coincidência, esse mês ainda eu vi uma referência que eu tenho no rap chamado MC Marechal, onde ele tava fazendo marca-página também com o trabalho dele, e isso eu já tinha feito em 2019. Isso é algo que significa que, com certeza, com quase toda certeza, ele não viu que eu fiz isso, né? Mas eu acho legal porque é uma coincidência muito bacana, de alguém que eu admiro, como artista, replicar algo que eu já tinha feito, mesmo sendo muito menor que ele, sendo muito menos reconhecido, sendo um cara que ainda tenho que aprender muito, porque ele já faz isso há muitos anos. Por exemplo, ‘Baita’ e ‘Te Quiero’ são músicas que eu produzi, que eu fiz, que eu me gravei, mixei, escrevi. Todas as músicas eu escrevo. O máximo que eu pesquiso numa internet pra fazer algo é pesquisar sinônimo pra não usar palavras repetidas. Mas não uso ChatGPT pra compor música, desestimula, principalmente, minha própria cabeça, minha mente. Hoje a maior superação que eu tenho que fazer é aumentar minha qualidade como produtor. Como eu tô me produzindo, eu tenho que aprimorar mais as minhas habilidades. Antigamente eu tinha pessoas que produziam, passei por alguns produtores, todos foram importantes pra acrescentar em algo, pra lançar uma música diferente, pra lançar num momento diferente. Hoje minha maior superação é mais nesse sentido.
Dissonância: Você já fez misturas até com o folk, quando tocou com o Lucas Rinor. Que outras misturas podemos esperar?

O Sandro Miguel: Depende muito do que eu estiver escutando, do que eu estiver observando. Se alguma coisa me chamar muita atenção, com certeza eu vou querer fazer a mistura e o céu é o limite. Tem muita coisa pra... nem quero que use a palavra ‘explorada’, que seja muito saboreada. Eu converso muito com o Lucas, é um amigo extraordinário. Foi meu professor de música, foi o cara que, na primeira aula me fez imaginar como eu gostaria de transpor a minha arte pra fora, pra colocar pras pessoas observarem. Então, eu vejo que o céu é o limite. Se alguém me falar assim: bah! Tem tal música! Seu achar interessante eu vou fazer, eu achei legal, achei interessante, não tem por que não misturar.

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